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A sociedade sem aborto

O aborto é praticado cotidianamente independente da classe social. Mas destacamos que a maior parte das vítimas de abortos mal sucedidos estão nas classes mais pobres. A decisão da comissão especial da Câmara dos Deputados (2017) aprovou proibição de aborto no país sem ressalvas para qualquer tipo de justificativa, entre eles estupro, risco à vida da mulher e bebês com má formação do cérebro (anencefalia) é, no mínimo, mais uma atitude de deputados preocupados com seus currais eleitorais, e não tem qualquer compromisso em resolver as demandas da sociedade.

A ComCausa defende que a prática do aborto não seja mais caracterizado como crime, porém a proposta, que já discutimos no Encontro Nacional dos Centros de referência em Direitos Humanos em 2012, é que a legalização da prática do aborto devia ser precedida de 5 a 10 anos de processos educacionais multisetoriais de prevenção da gravidez indesejada, para, ao final este procedimento fosse inclusive viabilizado, inclusive pelo SUS.

De uma forma ou de outra, a prática do aborto deixa consequências para as mulheres, principalmente as mais pobres. Pois em casos de sequelas das praticas em locais inapropriados, acaba de que qualquer forma no Sistema Único de Saúde (USUS). É uma hipocrisia da sociedade fingir que isso não existe e a pratica já demanda de recursos públicos de qualquer forma.

Entretanto gostaria de destacar que minha posição pessoal é contrária à prática do aborto. Mas ela existe e é cotidianamente realizado por mulheres em todas as camadas da sociedade e meu posicionamento pessoal, princípios filosóficos, não devem interferir no problema social. Em discussões como esta, devemos colocar nossa opinião de lado e buscar salvar vidas. O ideal, no meu entendimento, é que haja o mínimo de abortos na sociedade. Mas acredito que também as mulheres não podem ser criminalizadas, e quando levadas ao sistema de saúde por consequência de aborto, penalizadas em um atendimento desumano.

Para que a medida aprovada pela comissão especial da Câmara dos Deputados entre em vigor, depende de aprovação do plenário da Casa legislativa e, ainda, do Senado. Mas com certeza, veremos vários homens de bem e de bens, que utilizam os serviços de acompanhantes de luxo de Brasília, fazendo discursos inflamados, em nome de Deus, a fim de que as mulheres – como se a gestação fosse autônoma (aliás, alguém já registrou algum homem sendo preso por causa da pratica do aborto?) – sejam mais penalizadas.

| Matéria originalmente publicada no Jornal Hoje, de 14 de novembro de 2017  | Atualizado no dia 09 de junho de 2022.

Adriano Dias

Jornalista militante e fundador da #ComCausa

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