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Massacre Povo Ticuna

No ano de 1988, o Massacre do Capacete ganhou as manchetes mundiais. Este episódio na história indígena se deu nas proximidades do município de Benjamin Constant (AM).

Após a Funai ter demarcado as terras dos Ticuna como território indígena protegido pela constituição, obrigando todos os posseiros da região a se retirar do local. Os proprietários de terra se recusaram a sair, o que levou a reunião de Ticunas no dia 28 de março do mesmo ano em uma assembleia. Durante a sessão, 14 homens mascarados e vestidos com roupas camufladas surpreenderam os participantes ao abrirem fogo indiscriminadamente contra os indígenas, deixando um saldo de 23 feridos e 14 mortos, dentre eles, cinco crianças.

A cruel realidade vivida reforça a importância de manter viva a memória e os processos de resistência do Povo Ticuna ao logo dos últimos anos. A história vivida e suas expressões identitárias, artísticas e culturais se materializaram na criação do primeiro museu reconhecidamente indígena do Brasil. Com mais de 20 anos de existência, o Museu Magüta resiste no município de Benjamin Contant como um espaço de luta contra as dificuldades administrativas, políticas e estruturais para preservar o legado de seu povo.

Para Santo Cruz, diretor do Museu Magüta, a representatividade do Museu traz inúmeros significados ao Povo Ticuna. “A importância do Museu Magüta para mim é de grande valor, onde está guardada a memória dos meus antepassados, a memória do meu povo. Ali está todo o conhecimento e a forte identidade do Povo Ticuna, onde eu tenho orgulho porque é a marca da minha nação como o povo originário. Sem essa marca jamais viveremos”.

No museu encontram-se inúmeros registros e documentos que retratam o percurso de várias lideranças pela luta dos seus territórios na região do Alto Solimões. Nas conquistas de direitos e de territórios enfatiza-se o nome do Pedro Inácio Pinheiro (Ngematücü), uma liderança que se traduz na luta pelo seu povo. Nesse contexto, o museu Magüta torna-se o centro de referências de estudos para os próprios Ticunas, assim como para inúmeros pesquisadores e visitantes.

Desde sua inauguração, o museu tem participação direta e ativamente nos processos de mobilização política e de reafirmação étnica, estando presente nos acontecimentos mais importantes na história recente do povo Ticuna. Desempenhou um importante papel na implementação de um programa de implantação da Organização Geral dos Professores Ticuna Bilíngues(OGPTB); na formação de monitores de saúde e no combate à cólera; no treinamento de indígenas no registro em vídeo e informática; na criação de um programa de radiodifusão entre as aldeias; na demarcação topográfica de terras indígenas; entre outros.

A atividade do museu pode ser condensada no dito popular corrente entre os membros mais antigos do Povo Ticuna que diz “quando a gente Magüta desaparecer, o mundo inteiro irá se acabar”.

O Povo Ticuna teve seu primeiro contato com a sociedade envolvente no século XX, com maior intensidade a partir da década de 1970, através do projeto de integração Norte-Sul promovido pela ditadura militar iniciada em 1964. Reconhecido como a etnia indígena com o maior número de membros no país, encontram-se na região do Alto Solimões, na tríplice fronteira entre Brasil, Colômbia e Peru, alcançando um total de 41 mil pessoas. O termo Ticuna foi conferido a esse povo por seus vizinhos – na língua Tupi “taco-uma” significa “homens pintados de preto”, que se refere a sua tradição de pintura corporal a base de jenipapo.

Segundo sua mitologia, a história desse povo remete a um herói sobrenatural chamado Yo’i, responsável por pescar os primeiros Ticunadas águas vermelhas do Igarapé Eware, nas cabeceiras do Igarapé São Jerônimo. Durante os séculos, migraram entre regiões do Amazonas por conta de conflitos com grupos étnicos rivais e guerras entre Peru e Colômbia.

A partir dos anos 70 os Ticuna viram seu estilo de vida ameaçado, o que os forçou a se adaptar a uma nova realidade – a atividade de posseiros na região prejudicou drasticamente a caça, coleta e agricultura praticadas por eles. O momento de maior tensão advindo da “modernização” foi justamente o conflito de interesses entre os Ticuna e posseiros ali presentes.

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Emanoelle Cavalcanti

Acadêmica de psicologia, voluntária na Ong Médicos do Mundo