Sociedade civil apresenta recomendações ao G20 para enfrentar crises globais
Em um documento entregue ontem aos representantes das maiores economias do mundo, o grupo Civil Society 20 (C20) destacou a necessidade de medidas políticas para enfrentar as múltiplas crises globais, como as mudanças climáticas, a democracia e a desigualdade econômica. Foi a primeira vez que o C20 teve a oportunidade de apresentar suas propostas diretamente aos sherpas, representantes das 20 maiores economias do mundo.
O documento critica a atuação do G20, afirmando que o grupo tem falhado em “resolver efetivamente os riscos econômicos sistêmicos” e continua a promover modelos de produção e consumo “insustentáveis, extrativistas e excludentes”. Além disso, o C20 acusa o G20 de não prevenir e acabar com conflitos, como a guerra entre Rússia e Ucrânia, o “genocídio em curso na Palestina” e de não prestar assistência adequada a países em crise, como o Haiti.
O Civil Society 20 pediu que o G20 implemente políticas que considerem todos os grupos e populações vulneráveis. “Soluções existem, mas precisamos de governos que tomem decisões e estejam comprometidos a resolver problemas. Não precisamos de medidas paliativas”, afirmou Alessandra Nilo, sherpa do C20.
As recomendações incluem ações relacionadas a gênero, idade, antirracismo, deficiência e clima, garantindo acesso a trabalho decente, água, terra, moradia, segurança alimentar, educação universal, saúde e sistemas de proteção social.
Sem PIB per capita
No campo econômico, o C20 recomenda a substituição do PIB per capita por um índice que considere investimentos sociais, econômicos, climático e riscos para a definição de políticas globais. O grupo também pede a implementação de “planos de transição justa” baseados no desinvestimento em combustíveis fósseis, e promoção de medidas de mitigação e adaptação climáticas mais ambiciosas.
— Todos os biomas brasileiros estão conectados entre si e internacionalmente. A percepção desta interdependência é uma mensagem da sociedade civil — explica o presidente do C20, Henrique Frota.
O C20 recomendou a promoção de políticas fiscais “progressivas e justas”, baseadas na tributação de super-ricos e na redução de incentivos fiscais para setor privado e corporações que “geram externalidades sociais, econômicas e ambientais”.
O fechamento de paraísos fiscais, a eliminação da lavagem de dinheiro e de brechas que facilitem a sonegação fiscal também constam entre os objetivos do grupo, que pede o fortalecimento de instrumentos de cooperação internacional do G20 e trocas de informações entre os países para realização deste trabalho de contenção.
O que pede o C-20
- Direitos humanos: garantir a democracia e laicidade por meio de políticas públicas baseadas em evidências e integralmente financiadas pelos Estados.
- Economia: promoção de políticas fiscais globais progressivas e justas, além da redução da carga da dívida e seus custos para países de baixa e média renda.
- Bancos: reforma da estrutura de governança e práticas das Instituições Financeiras Internacionais.
- Mudanças climáticas: implementação de planos de transição justos, com desinvestimento em combustíveis fósseis e medidas de adaptação e mitigação climáticas mais ambiciosas.
- Desigualdade social: erradicação da pobreza e da fome, garantindo empregos decentes, segurança e acesso a saúde e educação.
- Mulheres: recomenda representação paritária na governança de instituições e a medição da contribuição do trabalho de cuidado não remunerado.
- Trabalho: destaca a necessidade de proteger direitos e segurança dos trabalhadores e erradicar a exploração.
- Saúde: recomenda garantir os direitos sexuais e reprodutivos para todos com serviços acessíveis e facilitados.
- Segurança: reduzir os gastos militares e a produção de armas, além de aumentar a proteção jurídica para organizações e movimentos da sociedade civil.
- Tecnologia: garantia da deliberação pública, além da transparência, responsabilização e aplicação sobre o desenvolvimento e uso digital.
Com o T20
Nesta semana, o C20 laçou uma declaração conjunta com o T20 — grupo que reúne think thanks e institutos de pesquisa do G20. O documento, que trata de economia, mudanças climáticas e digitalização, traz outras recomendações ao G20.
— Não vamos conseguir avançar na transição energética sem um olhar especial socioeconômico. O modelo atual é baseado em uma grande injustiça. Os países desenvolvidos foram os que mais poluíram, e quem mais sofre as consequências são as nações em desenvolvimento, que não têm acesso a financiamentos justos para a ação climática — avalia Maiara Folly, diretora-executiva da Plataforma CIPÓ e co-líder da Força-tarefa 02, “Ação Climática Sustentável e Transições Energéticas Justas e Inclusivas”, do T20 Brasil.