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Memória: Padre Jaime Crowe

Padre Jaime Crowe, figura emblemática na batalha contra a violência em São Paulo, faleceu no dia 20 de fevereiro de 2023. Conhecido por sua incansável luta contra as violações de direitos humanos no Jardim Ângela, na Zona Sul da cidade, o religioso deixou um legado marcante.

A Diocese do Campo Limpo confirmou o falecimento do padre, informando que ele estava em sua terra natal, a Irlanda, e que veio a óbito devido a um infarto enquanto realizava exames na Limerick Regional University.

O então presidente Luiz Inácio Lula da Silva manifestou pesar pela morte do padre em suas redes sociais, destacando a contribuição de Crowe para a comunidade do Jardim Ângela, liderando iniciativas em prol da paz e da vida.

Padre Jaime Crowe chegou ao Brasil em 1969 e dedicou-se ao Jardim Ângela desde 1986, atuando na Paróquia Santos Mártires, onde denunciava atos de violência e violações de direitos humanos.

Além disso, ele fundou a Sociedade Santos Mártires, uma associação civil e beneficente sem fins lucrativos, que desempenha um papel crucial na região do M’Boi Mirim, abrangendo o Jardim Ângela e o Jardim São Luís.

Seu trabalho incansável mobilizou a população local para pressionar as autoridades, resultando em reconhecimentos significativos, como o Prêmio USP de Direitos Humanos em 2005 e o Prêmio de Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns em 2016.

A Sociedade Santos Mártires publicou uma nota em que agradece ao trabalho realizado pelo religioso.

É com muito pesar que a Sociedade Santos Mártires comunica o falecimento do Padre Jaime Crowe, ocorrido nesta madrugada (20/2) na Irlanda, em decorrência de uma parada cardíaca. Uma vida dedicada à luta pela equidade, pelos direitos humanos e pela paz para todas as pessoas. Neste momento, ainda nos faltam palavras para agradecer tudo o que o Padre Jaime nos ensinou com simplicidade, amor e carinho para com o próximo. Seu legado jamais será esquecido, e seus ensinamentos sempre estarão em nossos corações, afinal, como ele sempre parafraseou um provérbio africano: “Gente simples, fazendo coisas simples em lugares de pouca importância geram grandes transformações”. Que Deus conforte sua família e nossos corações. Saudações corintianas“.

Legado:

O legado de Padre Jaime Crowe, uma figura que marcou profundamente a luta contra a violência e a desigualdade social em São Paulo, tem suas raízes na Irlanda, onde nasceu em 7 de março de 1945. Sua chegada ao Brasil em 1969 coincidiu com sua ordenação sacerdotal, e seu primeiro destino foi a cidade de Cotia, onde começou sua jornada pela língua portuguesa e se tornou Capelão do Convento Maria Imaculada das Irmãs Franciscanas de Boulander, no Ressaca.

Caracterizado por um sorriso largo, voz grave e uma determinação inabalável, Padre Jaime não se contentava com o status quo. Embora por vezes controverso, especialmente quando se tratava de questões de desigualdade social, ele era um líder incansável na busca por justiça e direitos humanos.

Em sua passagem por Embu das Artes, onde assumiu a paróquia Nossa Senhora do Rosário em 1970, Padre Jaime uniu forças com Dom Paulo Evaristo Arns, então arcebispo de São Paulo, em prol das comunidades carentes da região. Durante seu período lá, ele lutou ao lado do povo por melhores condições de vida, enfrentando até mesmo embates com autoridades locais.

Seu compromisso com os mais desfavorecidos permaneceu inabalável durante os anos de ditadura militar, quando ele travou batalhas pelo fim da violência política e esteve próximo de Dom Paulo Evaristo Arns.

No entanto, foi em Jardim Ângela, a partir de 1986, que Padre Jaime deixou sua marca mais indelével. Na paróquia Santos Mártires, ele denunciou incansavelmente as violações de direitos humanos e a violência que assolava a região, contribuindo para transformações significativas na comunidade.

Sua atuação não se limitou apenas às questões espirituais; ele foi o fundador da Sociedade Santos Mártires, uma ONG que se tornou uma fonte de esperança e apoio para os residentes do Jardim Ângela. Por meio de uma variedade de projetos, a ONG ofereceu assistência a milhares de pessoas e se tornou um farol de esperança em uma área marcada pela pobreza e pelo abandono das autoridades públicas.

As contribuições de Padre Jaime foram amplamente reconhecidas em vida, com homenagens e prêmios por seu trabalho incansável em prol dos direitos humanos. Sua morte, lamentada por políticos, colegas religiosos e a comunidade em geral, deixa um vazio, mas seu legado de luta e esperança continua vivo nas vidas daqueles que ele tocou e inspirou ao longo de sua trajetória extraordinária.

João Oscar

João Oscar é jornalista militante de direitos humanos da Baixada e colaborador da ComCausa