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O impacto do caso Menino Waldemiro na Legislação Brasileira de Proteção à Infância

Entre janeiro e 22 de fevereiro de 1926, uma série de eventos trágicos envolvendo o menino Waldemiro, um engraxate de 12 anos no Rio de Janeiro, provocou uma revolução nas leis brasileiras de proteção à infância. Este incidente catalisou a criação do Código de Menores, que viria a estabelecer a idade penal mínima de 18 anos no Brasil.

Em janeiro de 1926, Waldemiro, um jovem engraxate, foi preso após jogar tinta em um cliente que se recusou a pagar pelo serviço. Detido na Polícia Central, ele foi colocado em uma cela com vinte homens e, ao longo de quarenta dias, sofreu abusos sexuais e espancamentos. Sua condição deplorável foi descoberta pelos médicos da Santa Casa de Misericórdia, onde foi levado após ser libertado. A denúncia feita pelos médicos e publicada pelo jornal O Globo em março de 1926 gerou grande indignação pública.

A notícia chocou a sociedade do Rio de Janeiro e rapidamente se tornou um tema discutido em todo o país, chegando até o Congresso Nacional e o Palácio do Catete. O chefe de polícia do Distrito Federal, Hernani de Carvalho, foi convocado a prestar esclarecimentos ao presidente e, posteriormente, uma comissão de inquérito foi formada para investigar o caso, com Waldemiro sendo representado pelo advogado Luiz Lyra.

O caso levou à criação do Código de Menores, sancionado pelo presidente Washington Luís em 12 de outubro de 1927. Este foi o primeiro conjunto de leis no Brasil a tratar especificamente da proteção de crianças e adolescentes, estabelecendo que menores de 18 anos não poderiam ser criminalmente responsabilizados e encarcerados como adultos. Além disso, o código proibiu práticas como a “roda dos expostos”, um mecanismo que permitia o abandono anônimo de recém-nascidos em orfanatos.

Do Código de Menores ao ECA

No início do século XX, o Brasil enfrentava altos níveis de pobreza e desigualdade. A abolição da escravidão em 1888 deixou muitos ex-escravos e suas famílias desamparados, contribuindo para o aumento da criminalidade. Crianças e adolescentes pobres tinham poucas opções além do trabalho infantil ou da vida no crime, uma realidade que o Código de Menores tentou abordar. A criação do Serviço de Assistência ao Menor (SAM), precursor da atual Fundação Casa, foi uma das principais medidas decorrentes do Código de Menores. Embora inicialmente tenha sido visto como uma forma de tortura e repressão, o SAM representou um passo importante na institucionalização da proteção infantil no Brasil. O Código de Menores foi uma tentativa de oferecer proteção legal às crianças, mas enfrentou muitos desafios na implementação. Segundo historiadores como Sônia Câmara e Maria Luiza Marcilio, embora tenha trazido avanços significativos, o código falhou em garantir que as crianças sob custódia do Estado fossem tratadas com dignidade.

Hoje, termos pejorativos como “menor” foram substituídos por “criança” e “adolescente” no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que foi promulgado em 1990. O ECA enfatiza os direitos das crianças e adolescentes, marcando uma mudança fundamental no tratamento legal dos jovens no Brasil.

O caso do menino Waldemiro não só expôs as brutalidades enfrentadas por crianças pobres no início do século XX, mas também impulsionou reformas significativas na legislação brasileira de proteção à infância. Embora imperfeitas, essas reformas lançaram as bases para os direitos das crianças e adolescentes que conhecemos hoje.

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Adriano Dias

Jornalista militante e fundador da #ComCausa