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O que muda com a Proposta de Regulamentação para Trabalhadores de Aplicativos

O governo federal está nos estágios iniciais da elaboração de um projeto destinado à situação dos trabalhadores por aplicativos regulamentares, com o objetivo de apresentá-lo ao Congresso nos próximos dias. No entanto, um impasse persistente tem dificultado a conclusão do projeto, principalmente em relação ao estabelecimento de vínculos entre os aplicativos e os trabalhadores, bem como outras questões cruciais.

Esse tema tem sido discutido em um grupo de trabalho criado no Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) há quase cinco meses. A proposta se baseia em quatro pilares principais:

  • Estabelecimento de uma remuneração mínima,
  • Disposições relacionadas à segurança social,
  • Garantia de segurança no trabalho
  • Maior transparência nos pagamentos e critérios dos algoritmos

No entanto, o grupo enfrentou divergências graves em pontos-chave, como a definição da remuneração por hora trabalhada, a determinação da alíquota de contribuição para a Previdência Social, a natureza jurídica das aplicações e o tipo de vínculo que deve existir entre essas empresas e os trabalhadores.

A definição do projeto assume grande importância em um momento estratégico, já que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em parceria com o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, lançou recentemente uma iniciativa para proteger os direitos trabalhistas, com foco especial nos profissionais que atuam por meio de aplicativos.

Inicialmente, o governo de Lula buscava finalizar a proposta antes da Assembleia Geral da ONU e do encontro com Biden. No entanto, devido aos obstáculos nas negociações entre trabalhadores e empresas a respeito do texto, o prazo foi prorrogado até o final deste mês.

Caso não haja um consenso entre as partes envolvidas, o governo pretende seguir adiante com a elaboração da proposta e submetê-la ao Congresso.

O grupo encarregado de formular a proposta no Ministério do Trabalho e Emprego é composto por 45 membros, incluindo 15 representantes das empresas de aplicativos, 15 dos trabalhadores (como entregadores e motoristas) e 15 do governo. As reuniões são conduzidas por Gilberto Carvalho, membro do Partido dos Trabalhadores (PT) e atual secretário Nacional de Economia Solidária do MTE.

Embora todas as partes tenham reconhecido a importância fundamental da iniciativa governamental para a regulamentação do setor, membros do grupo de trabalho ouvidos pela reportagem afirmam que, até o momento, houve poucos avanços significativos nas negociações.

As empresas de aplicativos são instruídas especificamente por condições específicas enquanto buscam fechar um acordo no grupo de trabalho encarregado de regulamentar a situação dos trabalhadores por aplicativos. Uma das demandas cruciais das empresas é que o grupo defina a natureza jurídica delas como de intermediação de serviços, não de transporte. Além disso, as empresas buscam estabelecer que não há um vínculo trabalhista entre os profissionais e as plataformas, embora os trabalhadores resistam a essas propostas.

Jonas Valente, jornalista e professor que participa do grupo, traz uma perspectiva internacional por meio de seu trabalho no projeto Fairwork, uma iniciativa da Universidade de Oxford, no Reino Unido, que avalia as condições de trabalho em plataformas digitais e monitora propostas de regulamentação em todo o mundo. Valente enfatiza que o vínculo entre os trabalhadores de aplicativos e as empresas é uma questão central que ainda não foi abordada especificamente pelo grupo.

“A criação do Grupo de Trabalho foi uma iniciativa significativa. No entanto, até o momento, as têm discutido se concentrado principalmente em pagamentos e possíveis acordos sobre valores mínimos. É fundamental ir além e explorar medidas regulatórias que respeitem os direitos já garantidos pela legislação e enfrenta os desafios específicos enfrentados por esses trabalhadores. O governo desempenha um papel crucial ao apoiar uma agenda nessa direção”, destaca Valente.

A decisão de não abordar a natureza jurídica das empresas e os vínculos de trabalho foi tomada após as primeiras reuniões do grupo. Tanto representantes do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) quanto as partes envolvidas consideraram inviáveis ​​chegar a um acordo nesse ponto, deixando para a Justiça do Trabalho, o Supremo Tribunal Federal (STF) ou o Congresso a responsabilidade de lidar com o tema.

Os trabalhadores, por sua vez, argumentam que não são verdadeiramente independentes, já que não têm controle sobre os preços das entregas e corridas, seguem uma carga horária e uma rotina determinada pelas empresas, e estão subordinados às regras dos aplicativos. O entregador Nicolas Souza Santos, representante da Aliança Nacional dos Entregadores de Aplicativos (Anea) no grupo, afirma: “Não somos independentes. Não definimos o preço das entregas e corridas. Temos vínculo, carga horária, regularidade e subordinação. Esse é o ponto mais espinhoso de todos.”

Leandro da Cruz Medeiros, motorista e presidente do Sindicato dos Trabalhadores com Aplicativos de Transporte Terrestre de São Paulo, também faz parte do grupo e argumenta que o debate sobre o vínculo trabalhista deve ser suspenso pelo Judiciário, não em negociações sindicais. Ele ressalta que o governo é o único que trouxe as bases para a mesa de discussão e conquistou avanços importantes em áreas como a segurança social.

O grupo de trabalho inclui representantes de várias partes interessadas, com as plataformas sendo representadas pela Amobitec (Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia) e pelo MID (Movimento Inovação Digital). A Amobitec reúne gigantes como Uber, iFood, Amazon e 99, enquanto o MID representa 150 startups de diversos perfis, incluindo Rappi, OLX e Mercado Livre.

As negociações também abordaram questões como pagamentos, previdência, segurança no trabalho e transparência nas regras dos aplicativos. As empresas propõem pagamentos com base na hora redonda, enquanto os trabalhadores procuram um piso de salários mais elevado. A alíquota de contribuição ao INSS também está em discussão, com os trabalhadores defendendo uma redução na parte que cabe a eles.

No entanto, para Jonas Valente, o desafio reside em garantir que a diversidade de trabalhadores em plataformas seja pretendida contemplada. Ele destaca que o grupo se concentra principalmente em entregadores e motoristas, mas o problema afeta várias outras categorias de profissionais que também devem ser considerados.

No eixo da segurança, o governo planejou impor requisitos de segurança aos aplicativos e exigiu treinamentos para os trabalhadores assim que revisarem seus contratos com as empresas. Quanto à transparência, os aplicativos serão obrigados a fornecer aos profissionais, ao final de cada mês, um detalhe detalhado com informações sobre seus pagamentos, os critérios dos algoritmos e justificativas para eventuais punições e desligamentos.

A Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec) afirmou que está disposta a colaborar na criação de um modelo regulatório que equilibre a proteção social dos profissionais com um ecossistema equitativo para motoristas, passageiros e aplicativos. A entidade destaca que se trata de uma nova modalidade de atividade profissional que não se enquadra na legislação trabalhista tradicional.

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João Oscar

João Oscar é jornalista militante de direitos humanos da Baixada e colaborador da ComCausa