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Crianças são as maiores vítimas da violência sexual no Brasil

Os dados da 17ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, revelam uma realidade chocante. As crianças e adolescentes continuam sendo as principais vítimas da violência sexual, com números alarmantes: 10,4% das vítimas de violação são bebês e crianças de 0 a 4 anos; 17,7% têm entre 5 e 9 anos, e 33,2% estão na faixa etária de 10 a 13 anos. Isso significa que 61,4% das vítimas têm no máximo 13 anos. Surpreendentemente, aproximadamente 8 em cada 10 vítimas de violência sexual são menores de idade.

É importante lembrar que, de acordo com a legislação brasileira, uma pessoa só é considerada capaz de consentir a partir dos 14 anos. Na faixa etária de 14 a 17 anos, a maioria dos casos de estupro ainda é classificada como “estupro de vulnerável”, quando uma vítima não é capaz de oferecer resistência, independentemente de ter ou não consentido.

No que diz respeito ao sexo das perdas, as proporções têm se mantido constantes ao longo dos anos. No ano passado, 88,7% das vítimas foram do sexo feminino e 11,3% do sexo masculino.

O relatório também destaca que as pessoas negras continuam sendo as principais vítimas da violência sexual, e as proporções dessas vítimas aumentaram em comparação com o ano anterior. Em 2021, 56,8% das vítimas eram pretas ou pardas (no ano anterior eram 52,2%). Em relação às demais etnias, 42,3% das vítimas eram brancas, 0,5% indígenas e 0,4% amarelas.

Alguns padrões chamam a atenção, especialmente em relação às crianças e adolescentes entre 0 e 13 anos vítimas de violação no ano passado. Os principais agressores são familiares (64,4% dos casos), e 21,6% são conhecidos da vítima, mas não possuem relação de parentesco. Importante mencionar que 7,8% dos casos foram inicialmente registrados como sendo de autoria de parceiros ou ex-parceiros íntimos, mas foram reclassificados e incluídos na categoria “outros conhecidos”, uma vez que é impossível para pessoas dessa idade consentirem a uma relação sexual. Apenas 13,9% das ocorrências foram de autoria de pessoas desconhecidas das vítimas.

Considerando a autoria indicada no boletim de ocorrência, assim como nos anos anteriores, a maioria absoluta dos casos de violência sexual é cometida por conhecidos das vítimas (82,7%), enquanto apenas 17,3% dos registros são desconhecidos como autores.

Em relação ao local em que ocorreu o crime, a residência da vítima infelizmente aparece com maior frequência, totalizando em média 68,3% dos casos. A proporção dos estupros de vulnerável que ocorrem em casa é ainda maior, chegando a 71,6% dos casos, enquanto nos estupros a média é de 57,8%. A via pública, considerada um local de maior insegurança no imaginário social, foi apontada como o local de ocorrência da violência sexual em 17,4% dos registros de estupro e em 6,8% dos registros de estupro de vulnerável. Em média, apenas 1 em cada 10 casos de estupro/estupro de vulnerabilidade no Brasil ocorreram em via pública.

Outro dado alarmante é sobre o horário em que ocorre a violência sexual. Enquanto 53,3% dos casos de estupro acontecem à noite ou na madrugada (entre 18h e 05:59min), 65,1% das ocorrências de estupro de vulnerável, que sofreram principalmente crianças, ocorreram ao longo do dia, entre 06h e 11h59min, ou entre meio-dia e 17h59min, período em que a mãe ou cuidadora da criança em geral está fora, trabalhando.

Os estupros e violações de vulneráveis ​​que ocorreram em 2022 são predominantemente intrafamiliares, transitaram dentro de casa, durante o dia, e são como as principais vítimas que pessoas vivenciaram. Esses são fatores que tornam o enfrentamento a esse tipo de violência sexual extremamente desafiador. Provavelmente, estamos lidando aqui com situações de violência de gênero profundamente enraizadas, que são transmitidas através das gerações e, infelizmente, são naturalizadas nas relações familiares.

Esse cenário torna-se extremamente difícil para as vítimas sentirem as violências que sofrem e, quando o fazem, enfrentam grandes dificuldades em denunciar ou buscar ajuda. Além disso, o sistema de justiça e de proteção social também enfrenta enormes desafios em lidar com esses casos, gerados muitas vezes no retorno da criança ao convívio com o agressor, que esperava é punido. Devido à complexidade dessa questão, as respostas à violência sexual não são simples e precisam levar em consideração as diversas entidades do problema.

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Adriano Dias

Jornalista militante e fundador da #ComCausa