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Memória: Gabriela Sou da Paz

No dia 25 de março de 2003, a estudante Gabriela Prado Maia Ribeiro, de 14 anos, ia pela primeira vez pegar o metrô sozinha, na estação São Francisco Xavier, para saltar uma estação depois, na Saens Pena, quando ficou no meio do fogo cruzado entre um policial e bandidos que assaltavam uma bilheteria. Atingida no lado direito do peito, Gabriela não resistiu e morreu.

Na mesma ação, dois policiais ficaram feridos. Quatro bandidos chegaram à estação por volta das 15h30. Dois deles renderam um bilheteiro e dois ficaram na escada, dando cobertura aos cúmplices. Imagens gravadas pelo circuito interno de TV do metrô mostram os dois assaltantes dentro da bilheteria quando o policial civil Renato Lemos Naiff, de Brasília, se aproxima do guichê. De acordo com a policia, ele teria ficado muito tempo observando o movimento dos bandidos, o que provocou a suspeita deles. Um dos assaltantes saiu da cabine, rendeu o policial e o revistou. Quando viu que ele estava com uma arma, o ladrão deu dois tiros em Renato, atingindo-o na região lombar.

Em seguida, o detetive Luis Carlos Carvalho, da 17a. DP (São Cristóvão), que descia a escada de acesso a estação, notou um dos bandidos na cobertura. Quando ele tentou sacar a arma, o assaltante começou a disparar. O detetive, baleado duas vezes, ainda trocou tiros com o criminoso, mas havia outro marginal no alto da escada. Durante o confronto, uma bala perdida atingiu Gabriela, que também descia a escada para entrar na estação, onde havia pânico entre passageiros. Quatro Estações Ficaram Fechadas e a arma do policial não foi encontrada.

Depois de atingida, a estudante chegou a tentar fugir: subiu a escada e caiu na calcada, já do lado de fora.

– Ela caiu. Quando eu a segurei, ela ainda estava respirando, mas não respondia – disse a camelô Iradi do Nascimento.

Gabriela foi levada para o hospital do Andaraí, mas já chegou morta. Sua mãe, a psicóloga Cleyde do Prado Maia Santiago Ribeiro, esperava-a na Praça Saens Pena e estranhou o atraso. Ao saber do assalto, avisou ao marido, Carlos Ribeiro, que foi a estação, enquanto a mulher seguia para o hospital. Ambos tiveram logo a certeza da morte da filha: ele encontrou os óculos da adolescente na escada e ela recebeu a noticia no Andaraí.

Os dois bandidos que estavam na escada de acesso roubaram um Astra e fugiram. Os outros dois fugiram pelas trilhas do metrô. O sistema teve de ser desligado porque os trilhos são energizados e policiais fizeram buscas, mas os marginais escaparam. Por causa do desligamento, as estações Estácio, Afonso Pena, São Francisco Xavier e Saens Pena ficaram fechadas entre 15h43 e 16h25.

O policial de Brasília foi operado no hospital do Andaraí. Ferido na perna e no ombro, o detetive da 17a. DP foi levado para o Prontocor na Tijuca. Ambos não correm risco de vida.

Plano Era Fazer Festa de 15 Anos no Mar

Gabriela ganhou, ano passado, o premio de destaque do Colégio pH, na Tijuca, por ser uma excelente aluna. Seu pai, o psicólogo Carlos Santiago Ribeiro, de 45 anos, neste ano ia atender a um desejo de sua filha: alugar uma escuna para que a filha comemorasse seu aniversario, em 30 de agosto, navegando com a família e amigos em Angra dos Reis.

Quando eu entrar em casa e ver as coisas dela, sentir o cheiro dela, não sei o que vai acontecer. Adianta nos queixarmos do governo? Adianta dizer que estamos sitiados e entregues ao crime? Afinal, o que falta para que alguém acabe com esta violência? – disse o pai.

Gabriela, filha única, gostava de flores e cristais. Parecia com a mãe, a psicóloga Cleyde Prado Maia Ribeiro, que é espiritualista. Praticava natação e ginástica em uma academia da Tijuca, onde morava. Nos estudos, planejava cursar veterinária.

No hospital do Andaraí, a tia de Gabriela, estava revoltada com a falta de segurança: “Pelo amor de Deus, nos salvem desse inferno”

Para a mãe, a morte de Gabriela deve servir para que outros jovens não sejam vitimas da violência. Revoltada, ela dizia aos repórteres: “Mostrem tudo porque talvez alguém tome uma providencia e jovens não continuem morrendo inutilmente nas mãos de vagabundos.”

No Fim da Linha

Inaugurado em 1979, o metrô foi durante anos uma ilha de segurança entre os transportes coletivos do Rio. Enquanto o numero de assaltos a ônibus aumentava, o metrô garantia uma viagem tranqüila a seus passageiros. O quadro, no entanto, vêm mudando nos últimos anos. Somente este mês, foram registrados três ações violentas de bandidos no metrô.

No ultimo sábado, bandidos fizeram um arrastão dentro do vagão. Cerca de 50 passageiros que viajavam na Linha 2 foram assaltados. No ultimo dia 8, dois homens assaltaram a bilheteria de Del Castilho.

Arnaldo Mourthé, que foi presidente do metrô em duas épocas distintas – antes e depois – acha que dois fatores contribuíram para a mudança do quadro: o aumento da violência em todo o estado e a redução do pessoal, inclusive na área de segurança, adotada pela concessionária.

Fonte: Jornal O Globo – Primeiro Caderno em 26/03/2003.

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João Oscar

João Oscar é jornalista militante de direitos humanos da Baixada e colaborador da ComCausa