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Josimo: O Padre negro de sandálias surradas

Em 10 de maio de 1986, o padre Josimo foi morto sob ordens de fazendeiros da microrregião do Bico do Papagaio, localizada no estado de Tocantins, por sua atuação em defesa dos trabalhadores rurais.

Josimo Morais Tavares, nasceu em Marabá-PA em 1953. Com a grande enchente de 1957 seus pais se mudaram para Xambioá-GO, onde viveu até os 11 anos de idade, saindo de lá para entrar no Seminário Menor Leão XIII, em Tocantinópolis, dirigido pelos padres Orionitas.

Estudou filosofia no Instituto Filosófico dos Salesianos em Lorena-SP. Em 1975, vai para Petrópolis-RJ, estuda no Instituto Franciscano de Teologia e Filosofia. Neste mesmo ano conhece a Teologia da Libertação, pelas palavras e vivência do então Frei Leonardo Boff.

Em janeiro de 1979 foi ordenando na cidade de Xambioá, um mês depois, assumiu com outro padre a paróquia e o colégio de 1° e 2° grau de Wanderlândia-GO. No mês de junho o padre foi para Itália e não voltou, então Josimo teve que assumir todo o trabalho, inclusive a pastoral da terra. Foi coordenador da Pastoral da Juventude e depois Coordenador da Pastoral Geral da Diocese.

Transferido para a Paróquia São Sebastião, em Tocantins, lá foi vigário e coordenador da Comissão Pastoral da Terra, CPT, da diocese de Tocantinópolis. Incansável, ajuda os agricultores a organizar sindicatos e a exigir a reforma agrária, recém aprovado pelo governo. Cada pequena vitória dos camponeses aumenta o ódio dos senhorios.

Josimo era coordenador da Comissão Pastoral da Terra (CPT), conhecido na região como o “Padre negro de sandálias surradas”, Após tentativa de assassinato contra ele, no dia 15 de abril de 1986, quando cinco tiros foram disparados contra a Toyota que ele dirigia, profundamente ameaçado de morte e de ressurreição, incompreendido até por colegas padres e agentes de pastoral, padre Josimo foi “intimado” a elaborar um relatório de suas atividades e a esclarecer as circunstâncias que levaram a tantas ameaças de morte contra ele.

Em seu belíssimo Testamento Espiritual pronunciado durante a Assembleia Diocesana de Tocantinópolis, MA, no dia 27 de abril de 1986, poucos dias antes de seu assassinato, dizia Josimo que sua morte estava anunciada, encomendada e prescrita nos anais das correntes que desejavam ardentemente eliminá-lo. Novos Anás e novos Caifás já o haviam julgado. Mas Josimo se encontrava firme, pois havia assumido o seu trabalho pastoral no compromisso e na causa em favor dos pobres, dos oprimidos e injustiçados, impulsionado pela força do Evangelho. Josimo declarou:

“Pois é, gente, eu quero que vocês entendam que o que vem acontecendo não é fruto de nenhuma ideologia ou facção teológica, nem por mim mesmo, ou seja, pela minha personalidade. Acredito que o porquê de tudo isso se resume em três pontos principais:

– Por Deus ter me chamado com o dom da vocação sacerdotal e eu ter correspondido.

– Pelo senhor bispo, Dom Cornélio, ter me ordenado sacerdote.

– Pelo apoio do povo e do vigário de Xambioá, então Pe. João Caprioli, que me ajudaram a vencer nos estudos.

“O discípulo não é maior do que o Mestre. Se perseguirem a mim, hão de perseguir vocês também.”

Tenho que assumir. Agora estou empenhado na luta pela causa dos pobres lavradores indefesos, povo oprimido nas garras dos latifúndios. Se eu me calar, quem os defenderá? Quem lutará a seu favor? Eu pelo menos nada tenho a perder. Não tenho mulher, filhos e nem riqueza sequer, ninguém chorará por mim. Só tenho pena de uma pessoa: de minha mãe, que só tem a mim e mais ninguém por ela. Pobre. Viúva. Mas vocês ficam aí e cuidarão dela. Nem o medo me detém. É hora de assumir. Morro por uma justa causa. Agora quero que vocês entendam o seguinte: tudo isso que está acontecendo é uma consequência lógica resultante do meu trabalho na luta e defesa pelos pobres, em prol do Evangelho que me levou a assumir até as últimas consequências.

A minha vida nada vale em vista da morte de tantos pais lavradores assassinados, violentados e despejados de suas terras. Deixando mulheres e filhos abandonados, sem carinho, sem pão e sem lar. É hora de se levantar e fazer a diferença! Morro por uma causa justa.”

Em 1993, nova denúncia, apontou como mandantes do assassinato de Padre Josimo, Geraldo Paulo Vieira, Adailson Vieira, Osmar Teodoro da Silva, Guiomar Teodoro da Silva, Nazaré Teodoro da Silva e Osvaldino Teodoro da Silva e João Teodoro da Silva. Em 1998 Adailson Vieira, Geraldo Paulo Vieira (pai do Adailson) e Guiomar Teodoro da Silva foram julgados e condenados. Os dois primeiros foram condenados a 19 anos de reclusão e Guiomar, a 14 anos e 3 meses. João Teodoro da Silva faleceu antes de ser levado a julgamento. Geraldo morreu alguns meses depois da sentença. Osmar Teodoro da Silva ficou foragido durante anos, sendo capturado pela polícia somente em 2001, depois de ter sido alvo do programa Linha Direta, na TV Globo. Em setembro de 2003, ele foi condenado, por unanimidade, a 19 anos de reclusão.

Geraldo Rodrigues da Costa, o executor do crime, foi condenado, em 1988, a 18 anos e 6 meses de reclusão. Conseguiu fugir da penitenciária por três vezes, mas, depois da última fuga, nunca mais fora encontrado. Há informações de que faleceu durante fuga após um assalto na cidade de Guaraí, Tocantins.

Sua última palavra antes de morrer, no entanto, é para sua mãe, Dona Olinda: “Cuide dela, não a deixe sozinha”. Os bispos falaram com o presidente Sarney para pedir proteção após o atentado contra a vida de Josimo. Porém foi necessário que ele morresse para que todo o Brasil conhecesse a União Democrática Rural, UDR, organização latifundiário com os seus próprios serviços armados e apoio oficial em determinados Estados, responsável pela morte do Pe. Josimo.

Fonte com acréscimos: Irmandade dos mártires da Caminhada 

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João Oscar

João Oscar é jornalista militante de direitos humanos da Baixada e colaborador da ComCausa