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Rio será a primeira cidade a executar plano para população em situação de rua com o governo federal

A cidade do Rio de Janeiro será a primeira cidade a executar um plano de direitos humanos para a promoção dos direitos da população em situação de rua. Em um movimento pioneiro no Brasil, a prefeitura liderará a execução do “Plano Ruas Visíveis”, promovido pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC). O anúncio ocorrerá numa cerimônia no Museu de Arte do Rio nesta terça-feira (30), às 9h30, com a presença confirmada do ministro Silvio Almeida, do prefeito Eduardo Paes, entre outras autoridades.

Esta iniciativa é resultado de uma parceria que envolve 11 ministérios e visa atender diretamente mais de 20 mil pessoas em situação de rua no Rio, uma das cidades com maior registro deste contingente no país. Segundo dados do Observatório Nacional de Direitos Humanos (ObservaDH), o plano integrará ações em sete eixos: Assistência Social e Segurança Alimentar; Saúde; Violência Institucional; Cidadania, Educação e Cultura; Habitação; Trabalho e Renda; e Produção e Gestão de Dados.

Plano Ruas Visíveis – Pelo direito ao futuro da população em situação de rua

Em dezembro último, foi anunciado um investimento inicial de R$ 982 milhões, abrangendo todo o território nacional, marcando um esforço substancial para a melhoria das condições de vida desta população vulnerável. O MDHC destacou que a política adotada busca garantir não apenas a sobrevivência, mas a dignidade desses indivíduos, proporcionando-lhes oportunidades reais de reintegração social e econômica.

Local: Museu de Arte do Rio, localizado na Praça Mauá, no Centro, Rio de Janeiro.
Data: 30 de abril | Horário: das 9h30 às 12h

A ComCausa encaminhou propostas para a prefeitura e o Ministério

Recentemente, a ComCausa sistematizou informações sobre a população de rua no Rio de Janeiro e apresentou propostas tanto para a prefeitura local quanto para o Ministério dos Direitos Humanos. O fundador da instituição, o jornalista Adriano Dias, relatou que, desde 2020, exacerbado pela pandemia, a ComCausa intensificou suas iniciativas de apoio a indivíduos em situação de rua. Nos últimos quatro anos, “observou-se um aumento significativo dessa população”, tendência esta confirmada pelos resultados do Censo de População em Situação de Rua de 2022 realizado pela prefeitura e pelos dados de 2023 do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania (MDHC).

Segundo Adriano, uma informação que merece uma pesquisa mais detalhada é que, nas ações em que a ComCausa participou nos últimos anos, muitas das pessoas assistidas foram identificadas como originárias de cidades da região metropolitana do Rio de Janeiro. Algumas, apesar de possuírem laços familiares ou residências, optam por permanecer temporariamente nas ruas do centro da cidade.

Mulheres, crianças, LGBTQIA+, idosos e como indivíduos com transtornos mentais ou dependentes químicos

Outra atenção é em referencia da questão da violência física e letal, as pessoas em situação de rua enfrentam uma vulnerabilidade agravada por múltiplas circunstâncias sociais. É particularmente notório que mulheres, pessoas LGBTQIA+, especialmente mulheres trans, são mais suscetíveis. As crianças, sobretudo as de primeira infância, também estão em alto risco de sofrer violações. Ademais, é fundamental enfatizar que os idosos, assim como indivíduos com transtornos mentais ou dependentes químicos, são frequentemente alvos de ataques.

Diagnósticos mais rápidos

Adriano ressaltou que um aspecto importante do nosso estudo é a frequência com que diagnósticos e pesquisas são conduzidos, geralmente em intervalos de tempo extensos, o que complica a formulação de respostas que se alinhem adequadamente às necessidades e às rápidas mudanças observadas. Ele exemplificou: “Em nossa experiência, observamos micro territórios que inicialmente estavam livres de pessoas em situação de rua se tornarem densamente ocupados em poucos meses e, com a mesma rapidez, serem desocupados. Infelizmente, isso ocorre muitas vezes devido à violência e ações de agentes do estado que, supostamente, são financiados pelos comerciantes locais para realizar tais intervenções”.

Abordagem Dinâmica à População de Rua

Nas propostas apresentadas pela ComCausa, foi destacada a abordagem aos indivíduos em situação de rua, que, apesar de certas iniciativas de busca ativa, geralmente são estáticas e se restringem a dias e horários comerciais, limitando sua eficácia. Adriano Dias apontou que, apesar dessas buscas, falta uma estratégia logística sistematizada. “Essas ações só serão verdadeiramente eficazes se forem implementadas de forma móvel, adaptando-se aos dias, horários e locais onde essas pessoas realmente estão. Isso se deve ao fato de que frequentemente se movem por diversas áreas por várias razões, desde o medo de serem forçadas a permanecer em um local até a escassez de recursos para buscar ajuda”, destacou Adriano. Ele enfatizou que essa abordagem proativa busca superar a atuação baseada unicamente na demanda espontânea e tem o objetivo de proporcionar um acolhimento mais efetivo, além de orientação e acompanhamento aos serviços públicos necessários.

Desafios na abordagem da dependência de drogas entre a população em situação de rua

Adriano Dias aponta um aspecto crítico na assistência à população de rua: a dependência de drogas. Segundo ele, “há uma quase ausência de articulação para a implementação de tecnologias de redução de danos, tratando essa situação recorrente mais como uma questão policial do que de saúde. Existem poucas políticas de segurança ou assistência social que ofereçam soluções duradouras para este problema.” Esta observação destaca a necessidade urgente de reformular a abordagem atual, priorizando a saúde e o bem-estar em detrimento da penalização.

A invisibilidade e desumanização

Outra forma que representa uma das violências mais graves e disseminadas contra esse grupo é a invisibilidade enfrentada por essas pessoas. “Essa invisibilidade é caracterizada pela desumanização perpetrada por quase todos os setores da sociedade. Portanto, é fundamental abordar questões como a estigmatização e a percepção limitada dessas pessoas apenas como meras vítimas”, relata Adriano.

Intervenções pontuais e seus limites

Adriano ressalta que, embora existam iniciativas da sociedade e políticas públicas em desenvolvimento, a maioria das ações ainda é caracterizada pela sua natureza pontual. Especialmente aquelas provenientes da sociedade civil, que se limitam a medidas temporárias, devido a restrições de recursos. Por outro lado, as ações promovidas pelo poder público frequentemente reforçam preconceitos e aumentam a invisibilidade social, principalmente através de tentativas de realocar indivíduos para outros locais, muitas vezes sem o devido acompanhamento ou a busca por soluções adequadas.

Segundo ele, “Essas iniciativas raramente abordam questões críticas como conflitos interpessoais, problemas familiares, parentalidade, dependência química, saúde mental ou condições econômicas que poderiam promover a mobilidade social. Aspectos subjetivos, como relações afetivas, são frequentemente negligenciados”. Adriano Dias destacou a importância de considerar todos esses fatores: “Por exemplo, em nossa experiência, notamos que laços fortes com animais de estimação frequentemente representam o principal suporte emocional e fonte de motivação para algumas pessoas. Assim, torna-se fundamental também tratar os direitos dos animais com a devida sensibilidade”.

Custosas e com baixo retorno político

Na análise da ComCausa, observa-se que as ações direcionadas à população em situação de rua são frequentemente percebidas como custosas e com pouca visibilidade positiva para os agentes políticos, devido aos preconceitos ainda existentes. Além disso, a dificuldade em estabelecer uma rede articulada, que envolva tanto os diversos agentes públicos quanto instituições privadas atuantes, contribui para a perpetuação das condições dramáticas enfrentadas por muitas dessas pessoas. Adriano Dias comenta: “Atualmente, falta um mapeamento e uma articulação sistemática que formem uma rede de cooperação para acessar apoios privados disponíveis e as políticas implementadas pelos municípios da região metropolitana. Considerando a análise inicial, notamos que uma porcentagem significativa da população em situação de rua provém dos territórios no entorno da cidade do Rio de Janeiro, o que torna essa cooperação ainda mais imprescindível”.

Complexidades em múltiplos níveis

Por fim, Adriano listou o que seriam as complexidades em múltiplos níveis e propôs como essa questão deve ser abordada: “Em nossa observação da realidade das pessoas em situação de rua no Rio de Janeiro, podemos listar uma série de complexidades que necessitam de intervenções em múltiplos níveis para auxiliar essas pessoas a saírem de uma condição tão adversa. Em nossa sistematização de informações recente, destacamos os principais desafios enfrentados por essa população. Entre eles, estão os fatores que contribuem para o aumento da população em situação de rua, como o desemprego e as limitadas fontes de renda, sendo a reciclagem e a mendicância as principais formas de sustento. Essa realidade reflete as condições precárias de vida e trabalho que muitos enfrentam.”

Além disso, Adriano destaca questões de saúde, incluindo dependência química e transtornos mentais, que são extremamente prevalentes. A falta de convívio familiar e o isolamento social agravam ainda mais a situação dessas pessoas. A vulnerabilidade à violência, a implementação ineficaz de políticas de redução de danos, que frequentemente tratam a dependência química mais como uma questão policial do que de saúde, e a desumanização e invisibilidade exacerbadas pela estigmatização são outros graves problemas.

Adriano também apontou o que seriam uma falta de estratégias adequadas de abordagem e a ausência de coordenação efetiva entre os diferentes agentes públicos e privados, o que dificulta o acesso a políticas e apoios cruciais. “A falta de diálogo com a segurança pública e a não consideração de elementos subjetivos, como os vínculos afetivos com animais, entre outras referências, por exemplo, revelam uma visão limitada que atende apenas às necessidades imediatas, sem soluções multidisciplinares adaptáveis a cada contexto social e territorial.”

Este panorama reforça a necessidade de uma abordagem compreensiva e integrada para lidar com as múltiplas facetas deste desafio social. Entretanto, Adriano destacou que “Todas essas informações devem ser embasadas por estudos mais profundos para garantir intervenções eficazes”, afirma ele.

Governo anuncia grande investimento para o “Plano Ruas Visíveis”

| Editoria Virtuo Comunicação

Débora Barroso

Jornalista comunitária e colaboradora da ComCausa.